Pesquisa revela ameaça de desmatamento na Amazônia vinculada a frigoríficos

Sem rastreabilidade, pecuária na Amazônia pode levar ao desmatamento de 3 milhões de hectares até 2025

Uma pesquisa inédita conduzida pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) revelou que a pecuária, mesmo já ocupando mais de 80% das áreas desmatadas na Amazônia, poderia desencadear a derrubada de mais 3 milhões de hectares entre 2023 e 2025. A ausência de medidas efetivas, como a rastreabilidade de animais desde o nascimento, é apontada como fator crítico. A pesquisa avaliou o risco de destruição da floresta dentro das zonas potenciais de compra dos frigoríficos ativos na região.

A ameaça de destruição futura foi estimada levando em conta variáveis importantes para o desmatamento, como por exemplo inclinação do terreno; distância para rios, estradas e frigoríficos; classe territorial (terras indígenas, unidades de conservação, etc); e proximidade de derrubadas recentes e antigas.

Supermercados e compradores internacionais foram apontados como coniventes com o desmatamento, evidenciando uma tolerância à relação da pecuária com atividades ilegais na Amazônia. O mercado financeiro também foi criticado por fornecer créditos sem critérios sustentáveis para pecuaristas.

O estudo ressalta a necessidade urgente de ações governamentais para intensificar a fiscalização, punir infratores e exigir o rastreamento individual do gado desde o nascimento. A transparência nos dados de transporte dos bovinos e das fazendas de origem foi destacada como essencial para envolver os consumidores na fiscalização da cadeia pecuária na região amazônica.

A exposição dos frigoríficos ao desmatamento aumentou significativamente, passando de 6,8 milhões de hectares em 2016 para 14,2 milhões de hectares em 2022. A JBS lidera o ranking das empresas mais expostas aos riscos de devastação, seguida pela Vale Grande, Masterboi, Minerva e Mercúrio.

Conforme a pesquisadora Ritaumaria Pereira, uma das responsáveis pelo relatório, as companhias ficaram mais expostas principalmente por causa do aumento do desmatamento dentro de suas zonas de compra. “Entre 2016 e 2022, a destruição acumulada nessas áreas aumentou 113%”, observa a especialista. Além disso, o embargo adicional de 680 mil hectares e o aumento de quase três vezes no risco de devastação também contribuíram para essa maior exposição.

Indústria cresceu sem barrar a carne ilegal

A pesquisa também destacou o crescimento da indústria frigorífica, com um aumento de 14% no número de plantas ativas (de 127 em 2016 para 145 em 2022) e uma capacidade de abate de 65 mil animais por dia em 2022. Apesar dos aumentos, as empresas continuaram ineficientes em impedir a entrada de carne ilegal no mercado. 

Em 2016, apenas 35 empresas concordaram em não comprar animais provenientes da derrubada irregular da Amazônia, enquanto outras 63 ignoraram o acordo. Em 2022, embora o número de empresas signatárias tenha aumentado para 47, representando um acréscimo de 34%, a participação delas na capacidade de abate da região cresceu apenas 3%, passando de 68% para 71%. Isso significa que os 61 estabelecimentos não signatários ainda são responsáveis por 29% do abate na região.

Além disso, mesmo as empresas que assinaram o acordo não conseguem garantir a ausência de produtos ligados à devastação ilegal, pois não há controle sobre os fornecedores indiretos. Em outras palavras, os frigoríficos prestam contas apenas dos fornecedores diretos ao Ministério Público Federal, mas esses, embora legalizados, podem ter adquirido animais de fazendas irregulares, prática conhecida como “lavagem de gado”. A exigência de rastreabilidade desde o nascimento resolveria esse problema, mas algumas empresas só planejam implementar medidas nesse sentido após 2025.

Mapa mostra áreas de aquisição de animais e a capacidade de abate dos frigoríficos que assinaram e não assinaram o TAC, além das pastagens (Imagem: Imazon)

O pesquisador Paulo Barreto, um dos autores do estudo, destaca a inviabilidade desse prazo diante de um problema persistente há décadas, especialmente considerando seu potencial impacto no desmatamento, equivalente ao tamanho de Alagoas. Ele argumenta que medidas urgentes concentradas nas principais zonas de compra podem evitar uma grande parte da derrubada prevista, crucial em meio à emergência climática com secas no Norte e chuvas intensas no Sul.

Idayane Ferreira

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