Tela Preta

A psicologia diz que somos seres complexos, e que precisamos ter algumas necessidades a serem atendidas, entre elas, a de pertencimento.  Nem todos pertencemos a todos os espaços, mas imaginamos que pessoas como nós estão por toda parte, ocupando lugares de destaque e representando outras pessoas iguaizinhas, mas que não alcançaram ainda estes ambientes. Mesmo sendo a maior parcela do povo brasileiro, a população negra nem sempre conseguiu protagonizar momentos felizes e acessar um lugar de visibilidade na vida e arte.

Na vida real, as mazelas que impediram, e algumas vezes ainda impedem, negros do destaque das contribuições, desenvolvimento de potências e da liberdade de uma vida tranquila são bem conhecidas, os livros de História contam (às vezes, de maneira torta). Isso é assunto para outra coluna…, mas em resumo, começa com o processo de escravização e desemboca nos resquícios disso atualmente.

Já nas artes, parafraseando a celebre frase de Oscar Wilde, “a arte imita a vida”, os preconceitos praticados em sociedade são reproduzidos também em algumas obras de arte, reservando aos negros lugares figurativos, daqueles que entram mudos e saem calados e existem apenas para servirem aos protagonistas que, em sua maioria, são pessoas brancas. Nas telenovelas, um produto artístico mais apreciado e popular no Brasil, com seus enredos amplos e bem desenvolvidos, limita o imaginário popular para outras construções narrativas para pessoas pretas.

Avançamos na timeline da História, na vida e na arte. Socialmente, houve a criação de leis que objetivam superar os problemas históricos do processo de escravização e discriminação racial. Nas artes, e algumas outras áreas do entretenimento, tivemos algumas ascensões. Ainda tomando as novelas como exemplo, faz 55 anos que a primeira vez que uma mulher preta foi protagonista: Ruth de Sousa foi a atriz principal de “A cabana do pai Tomás”, na extinta Tv Tupi.

Acho muito pertinente o exemplo da novela para ilustrar, pois ela é arte de representar a realidade. Para demonstrar o avanço da representatividade em percentuais mais coerentes com a realidade brasileira, num feito inédito, a Rede Globo, a principal emissora de televisão do país, levou ao ar em sua grade de programação, no primeiro semestre de 2023,  produtos da dramaturgia protagonizados por pessoas negras. TODAS novelas tinham pelo menos um protagonista negro/a.

O passo mais ousado da emissora da Plim – Plim, e um grande acerto, na minha modesta opinião, foi ‘Vai na fé’, com um casting 70%  de atores e atrizes negr@s  foi um grande sucesso de audiência. Nela, embora a maioria dos negros  estivessem em núcleos de pessoas pobres, um problema a ser corrigido nas próximas produções, foi muito bom ver a tela preta, recheada de beleza e diversidade, mostrando que embora todos os/as negros/as, os personagens eram muito distintos, profundos e divertidos, tirando os estereótipos de sofredor eterno. 

É bom saber que futuras gerações vão crescer vendo cada vez mais gente como a gente na televisão, ter referências pretas de artistas, jornalistas, além de desenhos animados, com a nossa cor, nossas e novas narrativas, pois cada dia mais novos nomes surgem, novos profissionais aparecem e a tela vai se enegrecendo mais. Se na informática a tela preta é sinônima de problema, na televisão é solução de um problema. O Brasil preto precisa se ver, e  saber que pode estar no BBB, como em 2023, ser Domitila, ser” cacheada em transição(…), ver o seu black”, se descobrir negra, como Paula, brincar de Pequena  Sereia, noticiar com a leveza de Zileide Silva, ensinar bordões como Rita Batista, sair das telas e ir pra web, tal qual Manoel Soares e ser Luz como Larissa, sair dessa “saia justa”, olhar pra tela e sentir que “É de casa”.

Elencar esses exemplos, e abordar este tema parece simplório, mas a gente precisa olhar para as telas entender este espaço como sendo um lugar de troca, pois a linguagem além de objetiva, é mais acessível. É de fácil entendimento. No jogo das influências, o negro é influenciado e influenciador. As telas pretas são mais uma ferramenta para nos vermos, nos ouvirmos e nos representar.

Renato Sousa
Renato Sousa

É pisciano lúdico, casado com as letras, amante dos algoritmos. Navegante da Informaré desde os tempos do MSN. Na vida, “tudo me interessa, tudo tem mistério. Sou devoto da paixão”. Movido por minhas paixões, escreverei sobre internet, comportamento on-line e generalidades.

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