Que desenvolvimento, Açailândia?

Fim de ano, Natal, Páscoa… Sabe essas festividades? A gente para, e nessas paradas, a gente deseja coisas boas para quem está ao nosso redor: felicidade, paz, amor, sucesso, prosperidade, etc. Nessas paradas, a gente reflete sobre o que estamos fazendo da nossa vida e como podemos melhorar. Também fazemos essas pausas em nossos aniversários. Eu não sei como acontece com você, amig@ leitor@, mas o meu último aniversário, por exemplo, foi muito marcado pela introspecção e análise do meu projeto de vida.

Já quando uma cidade comemora seu aniversário, é mais raro fazer pausas para reflexão. Está todo mundo muito ocupado em organizar festas milionárias e desejar felicidades, sucesso, riqueza, desenvolvimento, progresso e blá blá blá blá.

À medida que se aproximava o aniversário de Açailândia, fui escrevendo este texto para romper com a lógica da festa. E se o aniversário de nossas cidades for um momento de introspecção e reflexão sobre os projetos de vida coletiva de nossos municípios? E se a gente parasse para discutir onde e quanto temos avançado DE VERDADE em relação aos nossos maiores problemas?

No início deste ano, defendi meu trabalho de conclusão de curso na Universidade e, em um dos capítulos, quis fazer provocações sobre o desenvolvimento da cidade de Açailândia. Afinal, que desenvolvimento?

Analiso em minha pesquisa que o primeiro evento oficial realizado neste território foi a visita do presidente da República, Juscelino Kubitschek, que incluía, entre outras coisas, a derrubada de uma árvore. Era a última árvore no caminho entre Belém e Brasília, a BR 010. O próprio Juscelino descreve a árvore em seu diário: “[lá estava] a árvore imensa. Media-a com os olhos. O caule projetava-se contra o céu quase sem galhos e abria-se, lá em cima, a fronde majestosa.” Logo depois, o presidente abate esta majestosa árvore pilotando um trator de esteira.

Juscelino era um arauto do progresso. Governou em função deste objetivo. E é ali, nesta imagem, neste ponto, neste exato momento, que nasce Açailândia. O que vem de cidade depois nasce sobre este tronco morto de jatobá. É o nosso mito fundador! O herói de nosso mito é um político demolidor de árvores.

É problemático que uma cidade nasça assim. Problemático que na memória e fotografia da cidade se pose feliz sobre o tombo de uma majestosa árvore que, supostamente, impedia nosso avanço (palavras de Juscelino).

Desta primeira imagem, desenvolveu-se no imaginário coletivo da região que Açailândia é mesmo a cidade do progresso. A gente tem tanto orgulho disso que nosso hino carrega esse lema: “Açailândia expresso progresso, eixo do Maranhão.” Isto não me parece apenas uma constatação sobre a cidade, não é uma descrição do que a cidade é, parece mais como um sentimento de obrigação que, sempre repetido, pode ser incorporado pelos seus cidadãos. A gente fala (e canta) tanto de progresso porque almeja isso, queremos ser a vitrine do progresso, o eixo do Maranhão, e pouco importa os custos para nossas realizações. É que progresso tem que vir a qualquer preço; mesmo que custe o nosso meio ambiente, nosso ar, nossos rios; mesmo que custe a saúde da nossa gente.

Nós precisamos deste progresso. Tenho visto esta noção, ou resquícios dela, sempre recorrentes na cidade, no imaginário popular, nas conversas de rua, no táxi, no ônibus, nos populares programas de rádio. E a repetição é num sentido de dependência mesmo: sem a siderurgia, a mineração e, agora, sem a soja, não podemos viver, a cidade vai quebrar. Qualquer empreendimento deste, por mais danoso que seja, é sempre muito bem-vindo porque nos ajuda a alcançar aquela meta de “ser eixo do Maranhão”. Qualquer dano estará justificado, independentemente de suas consequências.

Juscelino já escreveu sobre isso também, já justificava o progresso que avançava naquela década de 1950: “tendo-se em vista o engrandecimento do Brasil e a felicidade das futuras gerações”. É isso, gente. O fim justifica os meios, suaviza a angústia presente. É preciso resignar-se e ter muito orgulho por viver tudo isso.

Agora, vejam bem, já se passaram 42 anos de emancipação política e 64 anos desde a derrubada daquela árvore na visita presidencial. O modelo industrial e extrativista que fez esta cidade crescer mostra mais sinais de enfraquecimento, e a migração acelerada e o decrescimento populacional da cidade provam esta realidade. Do outro lado, a economia da cidade vai perdendo posição para outras cidades maranhenses, e o pior de tudo é que, quando estivemos melhores, no boom econômico da cidade, não soubemos aproveitar bem e avançamos pouquíssimo com educação, saúde e com as infraestruturas essenciais para desenvolver a cidade.

Erosões, rede de tratamento de água e esgoto, educação de qualidade. Quantos desses problemas conseguimos resolver enquanto Açailândia esteve entre as 3 maiores economias do Maranhão? Não resolvemos nem avançamos em nenhum deles.

Quanto custou e custará para a nossa cidade tratar, nos próximos anos, as doenças respiratórias, dermatológicas e os tipos de câncer que a poluição e os agrotóxicos provocam em nossa gente? A verdade é que a gente não tem plano. A verdade é que o que fica na cidade não é suficiente para pagar as consequências. Essas deveriam ser preocupações de quem faz 42 anos. Não dá pra fazer 42 anos e continuar agindo sem medir as consequências.

Que desenvolvimento, Açailândia?

Marcos Antonio
Marcos Antonio

Sou Marcos Antonio, de Açailândia – MA, Graduando em Ciências Sociais pela UFT, pesquisando sobre educação, movimentos sociais e território, mas atuando com a educação política, com as juventudes, e com a temática do emprego e renda. Nosso projeto mais recente é a formação de um coletivo de juventudes presente hoje em 05 cidades do MA e 01 do TO.

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