Pequena Coreografia do Adeus – Aline Bei

Dona de um estilo literário único, Aline Bei é uma escritora brasileira nascida em São Paulo, em 9 de outubro de 1987. Ela é graduada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo e em Artes Cênicas pelo Célia Helena Centro de Artes e Educação, também de São Paulo. Ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura em 2018, na categoria Melhor Romance de Autor com menos de 40 anos, com seu primeiro romance: “O Peso do Pássaro Morto”. Em 2022, Aline foi novamente finalista do Prêmio São Paulo de Literatura e ficou entre os cinco finalistas do 64º Prêmio Jabuti na categoria Romance Literário com seu segundo livro Pequena Coreografia do Adeus. Seguindo a prosa-poética que lhe rendeu milhares de leitores, a escritora constrói um retrato tão sensível quanto brutal sobre família, amor e abandono nesse livro.

Pequena Coreografia do Adeus conta a história de Júlia Terra que é também a narradora em primeira pessoa. O enredo se passa dentro de um lar de pais infelizes, eles se separam logo no início e Julia terá que lidar com uma nova configuração familiar e as inquietações do que significa crescer dentro e fora desse ambiente doméstico. Entre a mãe e a família existe muita tensão: a mãe é amarga, frustrada, repete a violência que também recebeu de sua mãe e desconta as frustações na filha em explosões de ira e ataques de agressão. Nesse livro vemos uma inversão, em muitos textos que lemos por aí, as agressões estão no masculino, aqui elas se encontram no feminino; o pai é apático e distante. Nesse livro, ficamos na expectativa se Júlia colocará no mundo mais das perspectivas dos seus pais, reproduzindo os padrões como fruto deles ou se conseguirá romper com esses ciclos de violência. Então, essa história vem com uma cara forte de dor, mas que é contada com muita leveza, porque Júlia também tem – ainda que, poucos – momentos de gratificação com seus pais, ou seja, ela se encontra com frustações, desejos não realizados, mas também conta com acolhimento e incentivo fora daquele ambiente doméstico.

A escrita não tem moldes tradicionais, a escritora usa recursos da poesia, alternância de letras maiúsculas e minúsculas, economias de palavras numa frase, espaçamentos que parecem que flutuam na página, o uso de minúsculas pra demonstrar introspecção, sussurros, algo mais íntimo, o que faz com que o leitor se transforme numa espécie de confidente. Na segunda parte do livro, que é no início da fase adulta, a personagem já consegue se achar na infância, mas meio que num movimento para a vida adulta só que ainda com algumas incógnitas. Há o cruzamento com outros personagens que aparecem como se fosse para ajudar a construir uma atmosfera mais fluida em volta de Julia e a favorecer a necessidade dela em tentar dar sentido, ou como uma boa observadora do cotidiano, aqueles que participavam de qualquer maneira de sua vida, a valorizá-los (por que não?). Toda aquela aridez do meio em que ela viveu, não a impediu de ser afetuosa e sensível, afinal, Júlia entende de abandono como poucos. Existe a repetição de sonhos da personagem, claro que diferente na infância para a vida adulta, onde ela tenta se desvencilhar dos traumas familiares e ensaia sua própria coreografia, numa sequência de movimentos de aproximação e afastamento de seus pais.

Entre sonhos, traumas, dores e anseios, Pequena Coreografia do Adeus é um relato cru, doloroso, belo e poético da vida de uma mulher marcada, em iguais proporções, pela dor e pelo amor. E é isso que nos faz transitar pelas páginas, como se em busca de ar, na expectativa do alívio — que não se concretiza como almejado. Mas, se não desistimos da espera, é porque Júlia também não desiste: de compreender, de sonhar, de encontrar o que talvez ela nem tenha consciência.

Andrelva Sousa
Andrelva Sousa

Graduada em Serviço Social pela UNISULMA e faço parte do Clube de Livros Mulheres em Prosa que é um grupo de leitura de mulheres que leem mulheres e que se reúnem uma vez a cada dois meses para debater uma obra de autoria feminina. Nessa coluna, pretendo compartilhar com vocês sobre as leituras que já fiz e quais as percepções que elas me trouxeram. Uma frase que gosto muito é da Rosa Luxemburgo que diz o seguinte: ”Quem não se movimenta não sente as correntes que o prendem”.

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