Na tarde deste domingo, 22 de dezembro, por volta das 14h30, a ponte Juscelino Kubitschek que liga as cidades de Estreito, no Maranhão, e Aguiarnópolis, no Tocantins, desabou. Com 533 metros de extensão, a estrutura cedeu enquanto veículos transitavam no local. O vereador de Aguiarnópolis, Elias Júnior, gravou um vídeo denunciando as precárias condições da ponte, registrando o exato momento em que parte da estrutura no lado tocantinense colapsou. No vídeo, é possível observar buracos surgindo no asfalto antes do desabamento.
Desde o ocorrido, o Terceiro Batalhão de Bombeiros de Imperatriz deslocou equipes para realizar buscas por desaparecidos. Até o momento, foram confirmados 16 desaparecidos, 3 óbitos e 1 pessoa resgatada. Na manhã de 23 de dezembro, as buscas foram temporariamente suspensas devido às condições inseguras de contaminação no local, segundo o comandante geral do Corpo de Bombeiros, Magnum Coelho.
De acordo com as autoridades, no momento do colapso, a ponte era utilizada por quatro automóveis, duas motocicletas e quatro caminhões, incluindo um que transportava ácido sulfúrico. Os governos do Tocantins e do Maranhão emitiram alertas para que a população das cidades próximas evitasse contato com a água do rio devido à alta toxicidade dos produtos químicos derramados.
Impactos ambientais
O biólogo Marcelo Francisco, professor na Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (Uemasul), destacou que o impacto é mais grave na região de Estreito e adjacências, com riscos à saúde pela exposição ao ácido sulfúrico: “O contato com a pele pode causar irritações e danos, enquanto a ingestão pode provocar problemas digestivos graves”.
Ele também apontou que a maioria das cidades da região é abastecida por poços, o que reduz o risco de contaminação da água potável. Marcelo ressaltou, entretanto, os danos à vida aquática: “A acidificação da água pode levar à morte de peixes e outras espécies”.
Marcelo destaca que, em Imperatriz, os efeitos dessa contaminação são, por enquanto, inexistentes: “De Estreito até Imperatriz, temos um trecho muito longo de um rio com vazão muito alta. Por isso, é muito pouco provável que esses contaminantes cheguem até aqui em níveis preocupantes. A população deve se acalmar. Como já foi colocado, agentes do estado estão vindo para analisar a água. Na própria Uemasul, intensificaremos o trabalho de análise do Rio Tocantins. Contudo, acredito que o impacto em Imperatriz não será imediato”, conclui o biólogo.
Abastecimento de água em Imperatriz e região
Em Imperatriz, a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) suspendeu temporariamente a captação e o fornecimento de água por precaução, segundo o gerente regional Pinheiro Júnior: “Até o momento, não detectamos alterações na qualidade da água tratada. Os 49 poços que abastecem a cidade continuam funcionando normalmente, produzindo 2 milhões de litros por hora”. Ele informou ainda que análises minuciosas estão sendo realizadas em parceria com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos.
O gerente regional argumenta que estão sendo traçados vários planos para a análise da água: “Iniciamos ontem uma análise mais minuciosa. Até o momento, não encontramos nenhuma alteração na água. Neste momento, estamos trabalhando em parceria com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos.”
A Caema também informou que os demais municípios da regional, abastecidos integralmente por poços, continuam com fornecimento normal. São eles: Açailândia, Buriticupu, Davinópolis, Cidelândia, Senador La Rocque, Cumaru, Montes Altos, São Pedro da Água Branca, Arame, João Lisboa, Amarante e Bom Jesus das Selvas.
Histórico de problemas na ponte Juscelino Kubitschek
A ponte Juscelino Kubitschek de Oliveira, inaugurada na década de 1960, já apresentava problemas estruturais desde os anos 1980. Moradores e autoridades alertaram sobre as condições precárias, especialmente devido ao tráfego intenso de veículos pesados.
Segundo o engenheiro civil e pesquisador em Ciências dos Materiais, Jhonatan Silva, a falta de manutenção preditiva e preventiva pode ter sido determinante para o desabamento. Ele destaca que diversos fatores devem ser considerados na manutenção de uma ponte: “Toda construção sofre desgaste com o tempo e precisa de manutenção. Na engenharia civil, trabalhamos com três tipos: a preditiva, a preventiva e a corretiva. A preditiva ocorre antes mesmo de surgir qualquer problema. Já a preventiva é realizada quando a estrutura começa a apresentar sinais de desgaste, geralmente após 15 anos, como pequenas fissuras. Pelo que entendi, essa ponte não recebeu manutenção preditiva nem preventiva. Nesse caso, entra a corretiva, que ocorre apenas quando o problema já é mais grave. Quando chegamos nesse ponto, a estrutura está próxima de apresentar sinais de colapso.”
O engenheiro complementa: “Provavelmente, o caso da ponte foi a falta de manutenção, porque é uma estrutura constantemente submetida a estresse e sobrecarga, seja pelo peso próprio, seja pelo tráfego de carros, ônibus e caminhões.”
Relatórios do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) já apontavam, desde 2019, que a ponte Juscelino Kubitschek de Oliveira, localizada entre Aguiarnópolis (TO) e Estreito (MA), estava em estado “ruim” de conservação. A estrutura, que desabou no último domingo (22), provocando ao menos duas mortes e deixando 15 desaparecidos, era classificada com nota 2 no Índice de Condição de Manutenção, onde 1 representa o estado mais crítico e 5 o mais satisfatório.
Construída há mais de 60 anos, a ponte era estratégica na BR-226, conectando o Maranhão ao Tocantins e integrando rotas importantes, como a Transamazônica (BR-230). Sua proximidade com a Ponte Ferroviária do Estreito, na Ferrovia Norte-Sul, e com a hidrelétrica de Estreito reforçava sua relevância para a infraestrutura regional.
Segundo dados obtidos pela Folha de S.Paulo, relatórios gerenciais de manutenção rodoviária, atualizados até julho de 2019, incluíam a ponte na categoria “amarela”, indicando problemas estruturais ou funcionais que requeriam atenção prioritária. Esses problemas poderiam incluir danos no concreto, fissuras, exposição de armaduras, falhas em fundações ou pilares, além de desgaste em juntas de dilatação ou sistemas de drenagem.
Dados consolidados pela Coordenação Geral de Planejamento e Pesquisa do DNIT mostram que, entre as 121 pontes federais no Tocantins, dez estavam na mesma situação da Juscelino Kubitschek, classificadas como “ruim” no relatório geral de operações rodoviárias de maio de 2023.
Em resposta à tragédia, o ministro dos Transportes, Renan Filho, afirmou que uma sindicância será instaurada para apurar as causas e responsabilidades. “Tomaremos todas as medidas cabíveis para esclarecer essa tragédia”, declarou à Folha de S.Paulo.
Em nota oficial, o Dnit informou, após vistoria nas cidades de Estreito (MA) e Aguiarnópolis (TO), as seguintes medidas:
- Decretação de emergência para acelerar os procedimentos administrativos necessários;
- Instauração de sindicância investigativa;
- Contratação emergencial para reconstrução da ponte ainda em 2024;
- Disponibilidade de recursos técnicos e financeiros para a reconstrução;
- Estipulação de 12 meses para a entrega da nova estrutura;
- Estimativa de custo entre R$ 100 milhões e R$ 150 milhões.
Impactos econômicos e logísticos
Neste momento, o impacto econômico se reflete no aumento dos custos logísticos, área responsável por planejar e controlar o fluxo de serviços desde sua origem até o destino final. O economista Fernando Babilônia analisa: “Nas cidades por onde o transporte passará a ser feito, poderemos observar mudanças na rotina local, devido ao aumento no fluxo de veículos de pequeno, médio e grande porte. Isso pode gerar tanto transtornos quanto oportunidades de dinamização em setores econômicos, como abastecimento, restaurantes e serviços mecânicos.”
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) divulgou as seguintes rotas alternativas:
Sentido Belém/Brasília, via Imperatriz (MA):
- Pela BR-010, em Imperatriz/MA, acessar à direita no km 249, na rotatória.
- Atravessar a Ponte Dom Affonso Felippe Gregory.
- Seguir pela TO-126 até Sítio Novo do Tocantins/TO.
- Continuar para Axixá do Tocantins/TO pela TO-201.
- Seguir pela TO-134 para São Bento do Tocantins/TO.
- Acessar a BR-230 em direção a Luzinópolis/TO e, então, Aguiarnópolis/TO.
- A partir de Aguiarnópolis, acessar a BR-226 e seguir em direção a Brasília/DF.
Sentido Brasília/Belém, via Aguiarnópolis/TO:
- Em Aguiarnópolis/TO, seguir pela BR-230 em direção a Luzinópolis/TO e São Bento do Tocantins/TO.
- Continuar para Axixá do Tocantins/TO pela TO-134.
- Seguir pela TO-201 até Sítio Novo do Tocantins/TO.
- Continuar para Imperatriz/MA pela TO-126.
- Atravessar a Ponte Dom Affonso Felippe Gregory e acessar a BR-010 em direção a Belém/PA.
Alternativa para quem segue de Balsas/MA a Brasília/DF:
- De Balsas/MA, seguir para Carolina/MA.
- Realizar a travessia do Rio Tocantins de balsa para Filadélfia/TO.
- Seguir pela TO-222 até Araguaína/TO.
- Acessar a BR-153 e continuar em direção a Brasília/DF.
Alternativa para quem segue de Brasília/DF a Balsas/MA:
- Em Araguaína/TO, seguir pela TO-222 até Filadélfia/TO.
- Realizar a travessia do Rio Tocantins de balsa para Carolina/MA.
- Seguir pela BR-230 para Balsas/MA.
Na manhã do dia 23, durante coletiva de imprensa, o governador do Tocantins, Wanderlei Barbosa, o governador do Maranhão, Carlos Brandão, e o ministro dos Transportes, Renan Filho, anunciaram a construção emergencial de uma nova ponte na rodovia federal BR-226 e medidas de suporte às famílias das vítimas.
Texto e apuração 2: Rennan Oliveira
Apuração inicial e revisão editorial: Idayane Ferreira