Não me recordo como descobri a feira de trocas de livros da biblioteca, mas assim que participei pela primeira vez, pareceu que já estive em todas as edições anteriores. O ritual segue sempre o mesmo padrão: selecionar entre os vários livros da estante aqueles que serão trocados por outros, guardar cuidadosamente na sacola de pano, pedalar até o espaço da biblioteca e passar horas (de verdade, horas mesmo) escolhendo três livros.
Ao chegar, a bibliotecária verifica a quantidade e se não são livros técnicos ou didáticos (esses não são permitidos para a troca e vão para a pilha de doação para a biblioteca). Ela escreve em um pequeno pedaço de papel, uma espécie de vale-troca, meu nome e o número de livros a que tenho direito, que é exatamente a quantidade de livros que levei: três. A sala onde ocorrem as trocas, anexa à biblioteca, é relativamente pequena, mas comporta quatro mesas abarrotadas de livros, divididos por temas. Em um canto que quase nunca encosto ficam os infantis e os religiosos.
Com o meu vale-troca em mãos, que me permite levar os três livros, escolho sempre o dobro na mesa de literatura brasileira ou estrangeira. Em uma espécie de jogo, comparo os livros e vou eliminando até sobrar a quantidade exata que tenho direito. Costumo passar mais de uma vez nas duas mesas maiores, titubeando entre um livro e outro. Não raro, penso que deveria ter levado mais livros para trocar. Mas no fundo sei por que levei apenas três: na maioria das vezes troco por livros do tipo calhamaço.
Já aconteceu de levar um livro duplicado, a “Antologia Poética” de Vinicius de Moraes, e ter que voltar na próxima feira para trocar. Ou de levar um livro para casa, lê-lo e depois levá-lo novamente para trocar. A verdade é que as feiras de trocas são um bom espaço para renovar de forma sustentável os títulos da estante.
Entre uma mesa e outra, meu olhar quase nunca se cruza com os de outros leitores que também levaram seus livros para trocar, seja porque os fixos nos livros sob as mesas, ou porque costumo ir em horários de menor movimento. Surpreendo-me com o bom estado dos livros e com os títulos disponíveis para troca. Certa vez, mal pude acreditar quando encontrei a “Poesia Completa” de Manoel de Barros, um exemplar praticamente novo de um livro esgotado que em sebos virtuais não sai por menos de R$200,00 e que eu queria muito ler.
Entre os pequenos grandes achados das minhas trocas de livros estão: “2666”, de Roberto Bolaño, um baita calhamaço do escritor chileno que estava há muito tempo na minha lista; um exemplar com riscos de caneta, mas totalmente legível de “Renato Russo de A a Z”, um compilado de frases do líder da banda Legião Urbana, que nunca encontrei para comprar; “Anarquistas, graças a Deus”, de Zélia Gattai, autora que chamou minha atenção depois que visitei a casa dela e de Jorge Amado, em Salvador; e um livro lindamente ilustrado e de capa dura chamado “Caminhos da Conquista: A formação do espaço brasileiro”. Volto sempre tão animada das feiras que não seria exagero dizer: é mesmo muito fácil me deixar feliz, basta duas mesas entulhadas de livros, duas horas e um vale-troca.