Sobre as antibibliotecas

Desconheço alguém que já tenha lido todos os livros de sua estante. E quando penso nisso me sinto menos mal por fazer parte da categoria de pessoas que tem vários livros, ainda assim dão um jeito de adquirir mais e possivelmente não vão conseguir ler todos. Não faz sentido nenhum, eu sei, mas é fato.

Já ouvi de alguns amigos, depois de olharem admirados para a minha estante: Nossa! Tu já leste tudo isso? Dou aquele sorriso meio sem graça, mostro uma carreira e meia de livros e digo: Não. Li apenas estes aqui. Então me dou conta de que há quatro carreiras e meia de livros esperando e mesmo que eu tenha criado o hábito de doar alguns depois de lidos, a quantidade de não lidos é maior.

Um amigo que também padece do mesmo mal compartilhou comigo o trechinho de um texto que dizia: 

“Uma biblioteca particular não é um apêndice estimulante do ego, mas ferramenta de pesquisa. Os livros já lidos são muito menos valiosos que os não lidos. A biblioteca deveria conter o máximo do que você não conhece conforme seus recursos financeiros, taxas de hipoteca e o atualmente inflexível mercado imobiliário permitem. Você vai acumular mais conhecimento e mais livros conforme envelhece e o crescente número de livros não lidos nas prateleiras olharão para você ameaçadoramente. Na verdade, quanto mais você sabe, maiores são as fileiras de livros não lidos. Vamos chamar essa coleção de livros não lidos de ‘antibiblioteca’”.

Isso foi dito pelo escritor italiano Umberto Eco (1932-2016). O autor de O nome da Rosa tinha nada mais nada menos do que 30 mil livros (!). Quando meu amigo e eu soubemos disso ficamos mais aliviados. “Se até o Umberto Eco tinha uma antibiblioteca, não precisamos ficar angustiados por termos mais livros do que a gente consegue ler, certo? ”, pensamos nós dois.

Não sei quantos livros há na minha estante, mas quando visitei meu amigo tive certeza de que ele possuía bem mais do que eu, porque seus livros estão espalhados por outros cômodos da casa. Isto é resultado de algo comum entre os donos de antibibliotecas: falta espaço para guardar todos os livros. E, embora não tenhamos dinheiro para comprá-los, nossa lista de desejos parece crescer a cada dia.

Nos últimos dois anos tenho repensado meus hábitos de consumo, o que implicou também na questão do acúmulo de coisas, como os livros. Passei orgulhosamente a fazer algo que é muito anti antibiblioteca: reduzi drasticamente a aquisição de livros e tento ler o que já tenho na estante. Em vez de comprar só porque está barato, compro o que está na minha lista e assim não sou movida pelo impulso na hora de adquirir um livro. Quando não, simplesmente me questiono: Idayane, você realmente precisa desse livro? E em quase 100% dos casos acabo não levando para casa. Tenho uma meta ousada para 2019 2022 2023: não comprar um livrinho sequer. Estou há alguns dias sem comprar livros, meu recorde é 52 dias.

Idayane Ferreira
Idayane Ferreira

“Jornalista com “abundância de ser feliz”, mais “da invencionática” do que “da informática”, acredita piamente que Manoel de Barros escreveu “O apanhador de desperdícios” baseando nela.“

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