Estes dias terminei de ver a série coreana “Amor, Casamento e Divórcio” e fiquei pensando nos encontros e desencontros dos parceiros e no que move as pessoas a fazerem parcerias.
Na série, há muitas formas de relacionamentos, mas a que me fez questão foi um casal de uns quarenta anos, casados há 15 anos em que o amor escorre na tela. A mulher, muito amorosa e cuidadosa, coloca as roupas íntimas deste homem no freezer para ele usar após o banho, pois ele sente muito calor; ele muito atencioso, escuta os problemas que ela enfrenta no trabalho. Uma relação de amor e de cuidado.
Eis que este homem faz uma viagem e conhece uma jovem 16 anos mais nova e se apaixona na hora em que ela come uma maça sem fazer barulho. Ele conta a jovem que isso o faz rememorar uma cena em sua pré-adolescência em que viaja com os pais de trem e vê uma jovem comendo uma maçã em silêncio. Freud diz que o amor é uma repetição, uma vez que o encontro amoroso, para ele é sempre um reencontro com a satisfação primária de um objeto de desejo primordial, neste caso, ouso a ponderar que seja comer maçã em silêncio.
Quando esta esposa dedicada e amorosa sabe que este marido tem um caso há mais de um ano, ela fica muda, nada consegue falar. Lembrei no exato momento, de um dizer de Lacan: um homem pode ser para uma mulher um estrago, uma devastação. Cada mulher, uma a uma, investe em suas parcerias a seu modo e no caso desta esposa, ver ruir sua aposta num casamento feliz e sólido a devastou a ponto de perder a voz.
Fico me perguntando do que é feito o amor entre parceiros. O que traz esta cena tão primitiva a este homem que o faz mergulhar no desconhecido de uma aventura com uma jovem e colocar em risco o que já tem e é tão caro a ele? Para Freud, a escolha do parceiro amoroso depende de algumas condições que causam o desejo, como um traço particular, ou um conjunto de traços, com íntima relação com a história singular e é próprio de cada um.
Engana-se quem acha que se relacionar é fácil. Passada a fase da paixão, ficam os amantes diante um do outro com suas fragilidades e seu desejo de continuarem fazendo planos juntos, mas nem sempre o amor é uma cola suficiente para deixar duas pessoas unidas. É preciso mais; é preciso dar um salto no desconhecido da vida a dois e ir construindo a dois a convivência, os encontros, os embaraços e os desencontros. E haja desejo de continuar juntos, hein? Amor exige trabalho.
Esses encontros, desencontros e o desejo de continuar juntos é uma aposta na parceria e no amor e, para tanto, cada casal inventa seus arranjos para permanecerem construindo os laços que os amarram no relacionamento, na tentativa de um certo apaziguamento ao alimentar a (falsa) ilusão de completude entre os dois.
Que este encontro é possível, nós sabemos, pois todos os dias vemos pessoas na tentativa de continuar suas relações, apostando no amor. Essa aposta pode se dar de diversas formas, porém, ficam juntos aqueles que investem nos laços. Uns mais apertados, outros mais frouxos, alguns são nós cegos e cada casal vai vivendo o seu desejo de ficar junto ao seu modo.
O que nos faz questão aqui é saber o quanto se tem de um e do outro nestas parcerias e o que faz estas pessoas permanecer juntas, a despeito do que se perde numa relação amorosa. Será que são estes laços e nós e suas amarrações?
Sou Lília Sampaio, psicóloga em Salvador, Bahia e uma psicanalista que gosta de histórias. Em minhas horas vagas, gosto de meus discos, livros, filmes, bichos, plantas, saidinhas com amigos e ficar em casa com minha família. Se você desejar fazer análise, faço atendimento presencial e online.