E se ler fosse proibido?

Tenho a sensação de que os livros sempre fizeram parte da minha vida, mesmo quando eu ainda nem sabia ler. Por isso, nunca imaginei um mundo onde não houvesse livros ou em que não fosse permitido ler por prazer. Sou das pessoas que proclamam por aí a frase do escritor argentino Jorge Luís Borges (1899 – 1986): “Sempre imaginei o paraíso como um tipo de biblioteca”. É então com certa dificuldade que tento idealizar uma sociedade onde os livros e qualquer prazer literário sejam proibidos.

As distopias ou anti utopias são formas negativas de conceber o futuro. Devo ter lido menos de uma dezena de livros do tipo e são sempre aterrorizantes. Dois deles, de modo especial, me chamaram a atenção. O primeiro é O conto da Aia (The Handmaid’s Tale), da escritora canadense Margaret Atwood (1939), que retrata uma sociedade teocrática onde as mulheres perderam todos os seus direitos e tornaram-se propriedade de um governo patriarcal, um sistema comandado por homens, onde estes são dotados de todos os privilégios. Para além das ótimas reflexões que o livro suscita, gostaria de focar um aspecto em específico: na sociedade de Gileard as mulheres foram proibidas de ler.

O segundo livro é Fahrenheit 451, do escritor americano Ray Bradbury (1920 – 2012). A história, escrita em 1953, se desenvolve em um mundo pós Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), onde o ato da leitura deixou de existir e o regime totalitário vigente proíbe a existência de qualquer tipo de livro. O pensamento individual e crítico é totalmente anulado. A interação entre as pessoas é mínima e o acesso às informações é feito por meio de telões. Alienadas, as pessoas funcionam como censoras uma das outras e a menor suspeita de que haja livros na casa de alguém, os bombeiros são acionados, não para apagar incêndios mas para queimar livros. O título da obra é alusivo à temperatura, em Fahrenheit, para a queima de papel.

Queima de livros e proibição do ato de ler não se limitam apenas ao universo ficcional e para mim se caracterizam como um dos piores tipos de cerceamento: é proibido pensar e principalmente, é proibido pensar diferente. Temos ao longo da história vários episódios nos quais livros foram censurados e incinerados. Na Alemanha nazista houve uma grande queima de livros de escritores que eram incômodos ao regime. Em 1937, na ditadura de Vargas, 1.640 livros do escritor baiano Jorge Amado foram apreendidos e queimados em praça pública sob o pretexto de serem “propagandistas do credo vermelho [comunismo]”. Ainda no Brasil, um caso ocorrido em 2018 também chamou atenção: livros com temáticas relacionadas aos direitos humanos de propriedade da Biblioteca Central da Universidade de Brasília (BCE-UnB) foram danificados intencionalmente.

Os livros e a educação são elementos poderosos contra a intolerância, a injustiça e para promoção da paz. A paquistanesa Malala Yousafzai foi baleada, em 2012, pelo Taleban por defender a educação para as meninas. Indicada ao Prêmio Nobel da Paz em 2013, a jovem disse em seu discurso:

 “Não há arma mais poderosa do que o conhecimento, nem maior fonte de conhecimento do que a palavra escrita. Canetas e livros são armas que derrotam o terrorismo”.

Idayane Ferreira
Idayane Ferreira

“Jornalista com “abundância de ser feliz”, mais “da invencionática” do que “da informática”, acredita piamente que Manoel de Barros escreveu “O apanhador de desperdícios” baseando nela.“

Outras colunas

Os livros clássicos são realmente bons?

O texto explora se os livros clássicos são realmente “bons” e discute o que faz um livro ser considerado um clássico. A autora reconhece que a qualidade de um livro é subjetiva e varia de acordo com o gosto pessoal e o contexto cultural dos leitores. Clássicos são geralmente valorizados por sua influência duradoura, profundidade temática e qualidade literária. No entanto, nem todos os leitores necessariamente apreciam esses livros, já que alguns podem achá-los datados ou difíceis de ler.

Pontuação “polêmica” e estilo narrativo

O texto analisa a obra “Um copo de cólera” de Raduan Nassar, destacando seu estilo narrativo que lembra José Saramago, com capítulos longos e sem pontuação convencional. Nassar combina poética e agressividade, criando uma narrativa intensa. A falta de nomes para os personagens principais e o uso único de pontuação são características marcantes. O autor também menciona críticas sem fundamento a “Ensaio sobre a cegueira” de Saramago, destacando a ignorância de alguns leitores sobre o estilo literário. O texto discute como a subversão das convenções de pontuação pode aumentar a expressividade e densidade das histórias.

Leia para uma criança

Como pessoa adulta, continuo gostando muito de livros infantis, este ano li “A mulher que matou o peixe” e “A vida íntima de Laura”, ambas obras de...

A moda na literatura

Moda e literatura podem parecer distantes, mas estão interligadas pela forma como as descrições de roupas em livros revelam status social e atmosfera de épocas, expressando identidade, cultura e história. Exemplos incluem “Madame Bovary”, onde as roupas de Emma Bovary refletem sua personalidade e aspirações, “O Grande Gatsby”, que mostra a opulência dos anos 1920, e “Bonequinha de Luxo”, onde Holly Golightly é sofisticada, mas na verdade pobre.

Todos os conteúdos de autoria editorial do Portal Assobiar podem ser reproduzidos, desde que não sejam alterados e que deem os devidos créditos.

REDES SOCIAIS