“A visão da depressão é recortada como alguém que não faz, não constrói, como alguém fraco e choroso. Mas é muito mais prudente associá-lo à falta da vitalidade, da vontade de fazer e não à tristeza. Todos os dias que eu acordei, trabalhei, voltei e tentei dormir, eu via minha energia e minha vontade se esvaindo, como num processo de expiração em que se sente pânico por ver o ar saindo. Eu passava os meus dias vazando” (Cecília Garcia Marcon)
Recebi a triste notícia de que uma amiga se suicidara, o que me causou uma profunda dor no coração, aquele nó na garganta e me fez lembrar de um livro que li no início de 2019, que não trata necessariamente do assunto, mas sobre a depressão.
O livro, muito bem escrito por sinal, se chama Tarja Preta: meu ano com depressão (Editora Nocaute). Conheci sua autora, a Cecília García Marcon, por causa do 30:MIN, um podcast (tipo de programa temático de rádio, disponível na internet) sobre literatura. Das três pessoas que geralmente apresentam o programa, a Cecília é a única mulher, a mais espirituosa e divertida e também a minha favorita. Qual não foi a minha surpresa ao saber que, assim como a minha amiga, ela tem depressão.
Li às 145 páginas de Tarja Preta numa sentada. O relato autobiográfico pulsante da Cecília me passou uma sensação de proximidade e de intimidade de quem conta algo difícil para um amigo de confiança. Ela relata, em 29 capítulos, as memórias sobre os diversos estágios de sua depressão, não seguindo para isso uma ordem cronológica. Expõe de forma honesta e direta um assunto ainda tabu em nossa sociedade e tece questionamentos, reflexões e desconstruções sobre a doença. E mesmo falando de um assunto difícil, consegue encontrar leveza e fazer a gente rir.
Não tenho depressão, mas lendo Tarja Preta lembrei de amigos e amigas que tiveram ou tem a doença. Infelizmente, há ainda muito estigma, incompreensão e falta de empatia, por isso o livro da Cecília “possui, claramente, o objetivo de ajudar. Estender a mão, balançar a bandeira ou ainda carregar no colo, aqueles que conhecem ou estão em situação semelhante e, por suas razões, ainda não procuraram ajuda”, como bem escreveu Gustavo Magnani, no texto de apresentação da obra.
“[..] a você, que leu, que sofre de depressão, que convive com pessoas que tenham a doença ou que saiba o que é conviver na pele com uma doença que você não escolheu e pela qual você é colocada na berlinda como grande responsável pela própria tragédia. Somos juntos. Daqui, só sai amor”. (Cecília García Marcon)
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