Palco de muitas histórias: Teatro Ferreira Gullar tem seu auge durante as festividades de fim de ano

Em novembro e dezembro o número de apresentações é maior que no restante do ano

Todo fim de ano é a mesma coisa: alguns artistas, que parecem estar “congelados,” reaparecem para festividades de Natal e Ano Novo, lançando músicas ou apresentações com essa temática. Mariah Carey, cantora e artista estadunidense, já é reconhecida como ícone natalino pelo mundo afora com seu single “All I Want For Christmas Is You“, lançado em 1994. A cantora se reinventa todo ano para não ficar obsoleta e se torna uma personalidade muito comentada e compartilhada nas redes sociais. Trazendo para o Brasil, o “Rei” Roberto Carlos ganha um programa especial de fim de ano, o Show da Virada, transmitido pela Rede Globo desde 1974 na TV aberta. 

Esses eventos acabam se tornando uma tradição, onde arte e criador se fundem em símbolos já consolidados para as celebrações de Natal e Ano Novo – um período que evoca renovação e esperança. Mas o que esses artistas têm em comum com o Teatro Ferreira Gullar, em Imperatriz? Assim como eles, o teatro também atinge seu auge nos meses de novembro e dezembro. Durante esse período, o “palco iluminado” do teatro recebe seu maior movimento, com escolas particulares e grupos de dança preparando espetáculos e musicais natalinos. A diferença, porém, é que enquanto esses artistas continuam ativos durante o ano, o Teatro de Imperatriz permanece praticamente vazio até o esperado fim de ano.

Lucas Gomes, professor de dança e produtor de espetáculos em Imperatriz, é sócio da companhia de dança Ponché e atua como coreógrafo e cenógrafo em diversas produções realizadas nesses meses. Ele conta que essa é uma temporada intensa de trabalho, pois escolas particulares e outras companhias de dança o procuram para criar, montar e produzir espetáculos. Por outro lado, ele destaca que, em outros períodos do ano, o mês de maio também traz uma alta demanda, devido ao Dia das Mães e ao mês mariano: “Maio tem bastante procura por causa do Dia das Mães, quando escolas nos procuram para realizar um musical com os alunos, em um evento mais íntimo para familiares, amigos e estudantes.”

Lucas Gomes em apresentação no Teatro Ferreira Gullar. Foto: Junior Oliveira

Ele explica que, por ser uma agenda estabelecida, as datas são marcadas com muita antecedência: “Nós, que fazemos espetáculos todos os anos nesses meses, normalmente agendamos com antecedência para não haver erro. Por exemplo, o de 2025 já está agendado para o fim de ano.”

A agenda é uma parte importante para ficar de olho, pois, como afirma Francisco Rego, conhecido como Chico do Teatro, diretor do Teatro Ferreira Gullar, no fim de ano o espaço fica lotado, e muitos acabam perdendo datas importantes:  “Normalmente, no fim de ano, são encerramentos de períodos letivos de escolas particulares, e os colégios nos procuram para realizar peças de Natal para pais e familiares, uma coisa mais fechada.” Ele explica que o teatro depende bastante dessas apresentações escolares e de uma companhia de teatro específica: “A companhia de teatro católica Ruah reserva suas datas com antecedência, pois, todos os anos, apresentam um especial de Natal. Outra companhia que sempre agenda antecipadamente é a Okazajo; no dia 27 de dezembro, aniversário do grupo, eles sempre fazem uma peça comemorativa.”

Segundo levantamento da Associação Artística de Imperatriz (Assarti), responsável pela criação do Teatro Ferreira Gullar, nos meses de novembro e dezembro de 2024, o teatro já tem 43 dias de apresentações agendadas: 23 dias reservados para novembro e 20 para dezembro. Em outubro, foram reservados 20 dias, enquanto setembro contou com 12 dias de eventos. “Em outubro, o teatro tem um bom movimento devido ao Grupo Mambembe de São Luís, um instituto voltado para peças teatrais infantis. Todos os anos eles reservam datas para apresentações escolares e um dia para o público em geral”, explica Chico. Nos demais meses, ele afirma que, em média, são reservados de 4 a 8 dias para peças e espetáculos.

Chico destaca que o abandono do teatro nos demais meses do ano se deve à falta de apoio da Fundação Cultural de Imperatriz para iniciativas artísticas, como oficinas de teatro e dança, que incentivem a participação da comunidade, das escolas públicas e apoiem grupos teatrais. Sem qualquer parceria entre a Fundação e o teatro, ele lamenta: “Culturalmente falando, a Fundação Cultural de Imperatriz não funciona; não temos nenhuma parceria, e deveríamos ter. Antes até existia, mas hoje isso não ocorre mais.”

Além disso, por o teatro ser de responsabilidade da Assarti, Chico aponta dificuldades para estabelecer parcerias com órgãos públicos: “Nós não temos ajuda do município nem do Estado. Para não dizer que não temos, a prefeitura paga, querendo ou não, a energia e a água, pois a energia daqui é cara, chega a ser de 7 a 9 mil reais, e até a água é cara também. Então, sobra o aluguel que fazemos pelo preço de 700 reais para pagar os colaboradores: uma recepcionista, sonoplasta, iluminador. Mas para projetos artísticos voltados para o teatro, não há apoio.” Saudoso, Chico espera que projetos antigos sejam retomados no espaço:  “Outro projeto importante para a divulgação da cultura em Imperatriz é o cinema no teatro, realizado pela Uemasul, mas já não existe mais aqui no espaço. Estamos pensando em voltar com esse projeto.”

O desaparecimento de grupos teatrais também contribui para o abandono do teatro. De acordo com Chico, o Grupo Okazajo, quando ativo, era responsável pela lotação do teatro em outros meses do ano: “Agora que o Grupo Okazajo deu uma parada, o teatro ficou um pouco esquecido, pois, quando ia ter uma peça do grupo, era muito divulgado. As pessoas me perguntam se o teatro fechou, pois nunca mais ouviram no rádio ou na televisão. Um dos problemas é esse, a falta de outros grupos de teatro como o Okazajo. Antes de eles pararem, todas as semanas do mês tinha apresentação.” O Okazajo, desde os anos 2000, sobrevive como o único grupo local de teatro e comédia, enquanto outras companhias surgiram e desapareceram ao longo dos anos.

O Teatro Ferreira Gullar, fundado em 1977, é um símbolo cultural da cidade, resultado da luta da Assarti, liderada pelo cantor e compositor Zeca Tocantins, que conseguiu recuperar o terreno onde o teatro está. Em 2002, o teatro passou por uma reforma no governo de José Reinaldo Tavares. Em 2019, foi iniciada uma segunda reforma para ampliação e climatização. De 160 assentos, passou para 230, mas ainda apresenta problemas na estrutura, como pouca iluminação e ambiente precário para trabalho na parte de masterização de som e controle de luzes.

Neste ano, a Assarti realizou uma reunião para eleger a nova diretoria do teatro, com planos de revitalizar o espaço e promover a educação artística: “Nós, da Assarti, conversamos para decidir quem será o novo diretor. Além disso, conversamos com o atual prefeito de Imperatriz, Rildo Amaral, para o teatro entrar no circuito cultural de Imperatriz. Na nova diretoria, pretendemos trazer bastante coisa para o teatro, parceria com as escolas, trazer escolas para cá e levar o teatro até as escolas. Mas estamos precisando de força e parceria com a Fundação Cultural.”

O Portal Assobiar buscou Rildo Amaral para questionar sobre investimentos e planos de valorização do teatro, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.

Por Rennan Oliveira

redação

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