Os livros clássicos são realmente bons?

Começo o texto de hoje avisando, de antemão, que não sei responder à pergunta do título: até agora, li bem poucos livros clássicos. Então, por que estou escrevendo sobre o assunto? Porque, como leitora e, principalmente, como jornalista, adoro fazer perguntas. E tenho muitas: o que faz um livro ser considerado um clássico? É só impressão minha ou a grande maioria dos clássicos foram escritos por homens? Sendo clássico, vou automaticamente gostar do livro? Clássicos são mais difíceis de ler? São todos bons?

O primeiro ponto é que, na literatura, o conceito de “bom” é subjetivo. Leitores não vão gostar de um determinado livro da mesma forma; isso depende de vários fatores, como gosto pessoal, contexto cultural e o que se busca em uma obra literária. Livros clássicos são frequentemente considerados “bons” devido à sua influência duradoura, profundidade temática e qualidade literária, mas isso não significa que sejam unanimemente apreciados ou que agradem a todos os leitores.

Lendo mais sobre o que torna um livro um clássico, encontrei alguns pontos a considerar:

  • Livros clássicos têm impacto significativo na literatura, na cultura ou na sociedade, moldando a literatura e influenciando gerações de escritores e leitores, sendo, portanto, longevos;
  • Geralmente, possuem qualidade de escrita, profundidade de ideias, personagens complexos, linguagem rica e exploram temas universais e atemporais;
  • Costumam oferecer camadas de significado, podendo ser revisitados em diferentes épocas e contextos e, ainda assim, revelando novos aspectos ou refletindo questões contemporâneas, o que contribui para sua relevância contínua;
  • A recepção crítica ao longo do tempo ajuda a definir o que se torna um clássico. No entanto, o gosto popular também desempenha um papel, já que algumas obras se tornam clássicas por sua popularidade duradoura entre os leitores;
  • Outro ponto que acho pertinente é que o que é considerado um clássico pode mudar com o tempo, à medida que novas obras e autores são descobertos e valorizados. Clássicos anteriormente negligenciados estão sendo reavaliados e reconhecidos por sua qualidade e relevância;
  • Clássicos são amplamente respeitados e apreciados por várias razões, mas isso não significa que todos os leitores os acharão “bons” ou que sejam imunes a críticas. Além disso, nem todos os clássicos são fáceis de ler ou agradáveis para todos. Alguns podem parecer datados, difíceis ou abordar temas ou estilos que não ressoam com o leitor atual. Esse ponto só ressalta o que digo no começo do texto: “bom” em literatura é relativo.

Pesquisando um pouco mais, consegui uma resposta a outra de minhas inquietações. De fato, historicamente, a maioria dos livros considerados clássicos foi escrita por homens. Basta pensar que as mulheres sempre enfrentaram inúmeras barreiras sociais e culturais que as restringiam ou as impediam de se tornarem escritoras e publicarem suas obras: as mulheres tinham acesso limitado (ou mesmo nenhum acesso) à educação formal; frequentemente, eram confinadas apenas ao papel de esposas e mães e desestimuladas a buscar carreiras acadêmicas ou na literatura; as que escreviam, muitas vezes, sofriam estigma social e, por vezes, se utilizavam de pseudônimos masculinos para que suas obras fossem levadas a sério; críticos e acadêmicos que definiam quais livros seriam considerados clássicos eram predominantemente homens (assim como os escritores).

Ainda bem que isso tem mudado nas últimas décadas, e muitas autoras que antes tiveram suas obras ignoradas ou negligenciadas pela crítica tradicional estão sendo redescobertas e reavaliadas, ampliando a definição de “clássico” para incluir mais vozes femininas. Um dos últimos livros que li, um clássico da literatura mundial, foi “O morro dos ventos uivantes”, da escritora e poetisa britânica Emily Brontë, publicado em 1847.

Há quem adore esse livro, há quem não goste muito, mas a verdade é que é impossível passar impune por essa leitura. Particularmente, fiquei fascinada pela obra – e seus personagens odiosos – e pela vida das irmãs Brontë: Anne, Emily e Charlotte. Basta dizer que eram escritoras, nascidas numa aldeia no interior da Inglaterra, responsáveis por alguns dos maiores clássicos da literatura inglesa e que, pela época e contexto cultural em que viviam (em que literatura não era coisa para mulheres), publicaram suas obras usando pseudônimos masculinos e, infelizmente, morreram muito jovens (Emily, por exemplo, aos 30 anos de idade).

Bom, e na literatura brasileira, temos obras clássicas escritas por mulheres? Temos! Lendo mais a respeito, me dei conta, inclusive, de que já havia lido alguns desses livros sem me atentar para o fato de que eram considerados clássicos modernos, como, por exemplo, “Perto do coração selvagem” (1943) e “A hora da estrela” (1977), ambos de Clarice Lispector; “Quarto de despejo: diário de uma favelada” (1960), de Carolina Maria de Jesus; e “O Quinze” (1930), de Rachel de Queiroz.

Para encerrar, fiz uma lista com livros clássicos (da literatura mundial e brasileira) frequentemente encontrados em listas de “clássicos” devido à sua relevância histórica, literária e cultural. Eles abrangem uma variedade de épocas, estilos e autores (deixei um asterisco nos que já li).

Dom Quixote – Miguel de Cervantes
Moby Dick – Herman Melville
Guerra e Paz – Liev Tolstói
A Divina Comédia – Dante Alighieri
Ulisses – James Joyce

Hamlet – William Shakespeare
1984* – George Orwell
O Grande Gatsby* – F. Scott Fitzgerald
Em Busca do Tempo Perdido – Marcel Proust
O Processo – Franz Kafka
Cem Anos de Solidão* – Gabriel García Márquez
Crime e Castigo – Fiódor Dostoiévski
Madame Bovary – Gustave Flaubert
Odisseia – Homero
A Metamorfose* – Franz Kafka
O Apanhador no Campo de Centeio* – J.D. Salinger
A Revolução dos Bichos* – George Orwell
Anna Karenina – Liev Tolstói
O Retrato de Dorian Gray* – Oscar Wilde
Jane Eyre – Charlotte Brontë
Frankenstein – Mary Shelley
O Morro dos Ventos Uivantes* – Emily Brontë
O Estrangeiro – Albert Camus
O Vermelho e o Negro – Stendhal
O Sol é Para Todos – Harper Lee
Orgulho e Preconceito – Jane Austen
Mrs. Dalloway – Virginia Woolf
O Senhor dos Anéis – J.R.R. Tolkien
Drácula – Bram Stoker
O Coração das Trevas – Joseph Conrad
O Velho e o Mar – Ernest Hemingway
O Primo Basílio – Eça de Queirós
O Amor nos Tempos do Cólera – Gabriel García Márquez
Morte em Veneza – Thomas Mann

O Amante de Lady Chatterley – D.H. Lawrence
Memórias Póstumas de Brás Cubas* – Machado de Assis
O Idiota – Fiódor Dostoiévski
As Vinhas da Ira – John Steinbeck
Os Irmãos Karamazov – Fiódor Dostoiévski
A Letra Escarlate – Nathaniel Hawthorne
A Montanha Mágica – Thomas Mann
Lolita – Vladimir Nabokov
O Som e a Fúria – William Faulkner
Cândido – Voltaire
A Ilíada – Homero
O Médico e o Monstro – Robert Louis Stevenson
Grandes Esperanças – Charles Dickens
Os Miseráveis – Victor Hugo
O Retrato de uma Senhora – Henry James
O Lobo da Estepe – Hermann Hesse
O Mestre e Margarida – Mikhail Bulgákov
Eneida – Virgílio
Pais e Filhos – Ivan Turguêniev
A Vida de Galileu – Bertolt Brecht
O Nome da Rosa – Umberto Eco
Medeia – Eurípides
A República – Platão
As Mil e Uma Noites – Anônimo
As Aventuras de Huckleberry Finn – Mark Twain
O Conde de Monte Cristo – Alexandre Dumas
A Peste – Albert Camus
O Jardim Secreto – Frances Hodgson Burnett
O Leopardo – Giuseppe Tomasi di Lampedusa

O Castelo – Franz Kafka
A Dama das Camélias* – Alexandre Dumas Filho
A Letra Escarlate – Nathaniel Hawthorne
Os Três Mosqueteiros – Alexandre Dumas
O Encontro Marcado – Fernando Sabino
Senhora – José de Alencar
O Ateneu – Raul Pompeia
Iracema – José de Alencar
A Queda – Albert Camus
Vidas Secas* – Graciliano Ramos
Dom Casmurro* – Machado de Assis
A Moreninha – Joaquim Manuel de Macedo
O Guarani – José de Alencar
Tenda dos Milagres – Jorge Amado
Grande Sertão: Veredas – João Guimarães Rosa
Macunaíma – Mário de Andrade
Os Sertões – Euclides da Cunha
O Cortiço – Aluísio Azevedo
O Auto da Compadecida – Ariano Suassuna
São Bernardo – Graciliano Ramos
Capitães da Areia – Jorge Amado
Memorial de Maria Moura – Rachel de Queiroz
Quarto de Despejo* – Carolina Maria de Jesus
Clarissa – Erico Verissimo
Incidente em Antares – Erico Verissimo
Morte e Vida Severina – João Cabral de Melo Neto
Canaã – Graça Aranha
O Tronco – Bernardo Élis
Inocência – Visconde de Taunay

Mar Morto – Jorge Amado
Dois Irmãos – Milton Hatoum
A Hora da Estrela* – Clarice Lispector
O Tempo e o Vento – Erico Verissimo
Memórias de um Sargento de Milícias* – Manuel Antônio de Almeida
Lucíola – José de Alencar

Idayane Ferreira
Idayane Ferreira

“Jornalista com “abundância de ser feliz”, mais “da invencionática” do que “da informática”, acredita piamente que Manoel de Barros escreveu “O apanhador de desperdícios” baseando nela.“

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