Essa indicação chega junto com as férias de julho, e eu não poderia deixar de falar sobre esse livro “ideal para se ler nas férias”, tanto pelo tamanho dele – quase 500 páginas –, quanto pelo arrebatamento das histórias que você não vai conseguir parar de ler. Então, é melhor que esteja de férias. O livro é de uma escritora britânica, a quarta de oito filhos nascidos de mãe branca inglesa, professora, e pai nigeriano, que migrou para a Grã-Bretanha em 1949 e tornou-se soldador e conselheiro trabalhista local. Bernadine Evaristo nasceu em Eltham, sudeste de Londres, sendo batizada como Bernardine Anne Mobolaji Evaristo. Em julho de 2019, seu romance “Garota, Mulher, Outras” foi listado para o Booker Prize e para o Gordon Burn Prize de 2019. A vitória fez dela a primeira mulher negra e o primeiro autor britânico negro a ganhar o prêmio. Além disso, o livro também foi selecionado para o Prêmio das Mulheres 2020 de Ficção.
“Garota, Mulher, Outras” não tem uma história específica da qual se possa falar. O livro é dividido em cinco partes, sendo que as quatro primeiras partes são divididas, cada uma, em três personagens que funcionam quase que como um pequeno núcleo de novela em que as histórias se entrelaçam. Assim, vai-se construindo as narrativas. São doze personagens femininas e uma pessoa não-binária, com idades entre 12 e 93 anos. Elas são uma mistura de origens culturais, sexualidades, classes e geografias, e o romance expõe as suas esperanças, lutas e vidas que se cruzam. O romance aborda questões de gênero, raça e classe. Cada personagem é protagonista e narradora do seu próprio capítulo, mas ao longo das narrações das outras personagens, elas eventualmente aparecem sendo contadas a partir de outro ponto de vista.
Em cada uma das personagens, temos uma espécie de grande monografia sobre o ser humano. A autora traz a pincelada do que é cada personagem na vida das outras e, por vezes, pensamos que a personagem é incrível e, em outras, como é uma pessoa horrível. Ao ler cada história, enxergamos todas as camadas que as atravessam, entendendo por que cada uma reage de determinada maneira e não de outra, qual o histórico por trás de suas ações. De forma resumida, Bernadine conta sobre dramas comuns e particulares de mulheres negras, afrodescendentes e pessoas não-binárias, com o objetivo de compor um retrato diverso e complexo da interseccionalidade. A escrita é envolvente e descompromissada de pontuação e argumentação tradicional, com um parágrafo sem começo, meio e fim.
Não é um livro simples ou fácil de ler, pois se propõe a contar histórias de sofrimento de figuras que se opõem aos valores tradicionais e representações normativas de raça, gênero e sexualidade. Qualquer incômodo e estranhamento é o que caracteriza a experiência de leitura, o que demonstra como a obra é essencial nos tempos atuais. É uma leitura que faz movimentar muitas perspectivas sobre as diferentes mulheres que existem na sociedade e transformou meu olhar enquanto leitora branca.
Graduada em Serviço Social pela UNISULMA e faço parte do Clube de Livros Mulheres em Prosa que é um grupo de leitura de mulheres que leem mulheres e que se reúnem uma vez a cada dois meses para debater uma obra de autoria feminina. Nessa coluna, pretendo compartilhar com vocês sobre as leituras que já fiz e quais as percepções que elas me trouxeram. Uma frase que gosto muito é da Rosa Luxemburgo que diz o seguinte: ”Quem não se movimenta não sente as correntes que o prendem”.